Blanche's rebellion weblog. Beware...

6.9.05

Ângela Lehve parte num sei. Perguntem pro Caike. ^.^
Continuando a saga...
No último capítulo, em uma cena de ação eletrizante, Dr. Moura, Diego e Ângela conseguem combinar esforços para capturar o último dos invasores da Agência. Escapando por um triz, eles chegam não tão sãos mas salvos ao salão de vigilância.


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Quando Ângela abriu os olhos, a primeira coisa que viu não foi o número absurdo de seres dos mais variados tipos e formatos* que se aglomeravam fora da cabine do Seu Antônio, nem todo o arsenal bélico que estava empilhado em uma enorme montanha ao longo da parede do salão, mesas e qualquer canto possível. A primeira coisa que Ângela viu foi uma enorme careca atravessada horizontalmente por alguns raros fiapos de cabelo. Seu primeiro instinto a fez dar um pulo para trás.

- Calma, minha filha. – E o dono da careca levantou. Ela pôde ver o Dr. Moura, de cujas orelhas saíam cabos do que parecia ser um estetoscópio high-tech. – O soro. Assim você pode se machucar.

Ela então olhou para o seu próprio braço, e viu uma agulha ligada a um tubo, que por sua vez estava ligado a um frasco com um líquido verde-esmeralda.

- E isso é...
- Um estimulante que também combate a fadiga dos músculos. Eu não sei se vai funcionar, porque não sei se os seus músculos são quem realmente faz o trabalho... Mas mal não vai fazer. Diego? – Dr. Moura tirou e guardou o estetoscópio.
- Oi.
- Como está o nosso amigo?
- Ou ele é um excelente ator, ou ainda vai dormir por um bom tempo...
- Bom... por via das dúvidas, vamos injetar um paralisante...
- Olha, a sobrancelha dele mexeu!
- E isso quer dizer que....
- Ele está acordado! Que sacana!
- Ótimo. – Dr. Moura vai se aproximando lentamente do espião “adormecido”. Ele tira do bolso uma seringa e, com uma pontinha da língua para fora e um olho fechado, verifica se não há ar apertando o êmbolo diante do seu rosto – o Hélio** disse que este é do bom. Vamos ver a quantas anda o talento do nosso gênio da química de plantão.

- Nããããão....

O líquido era assustadoramente transparente. Dr. Moura espeta a agulha em um dos braços amarrados do indivíduo. Ângela olha estupefata, cogitando seriamente rever seus conceitos sobre aquele amável senhor careca e barrigudo.

- Você vai sentir um calor percorrer o seu corpo e depois vai relaxar. Seus músculos vão ficar mais soltos. O efeito demora um pouco, então você pode falar comigo no processo.
- Gahh
- É claro que existe um antídoto, e é claro que eu vou lhe oferecer uma barganha. Se você me der todas as informações sobre a Gutierrez, eu lhe aplico o antídoto e deixo você ir. Dependendo do que você me contar, eu até arranjo passagens para você com destino ao lugar nenhum. – e Dr. Moura sorriu.
- Ei.... cê vai deixar ele andar depois?? Mas aí ele vai contar tudo pra....
- No momento em que esse homem foi capturado, Diego, ele se tornou um desertor. Mesmo que ele não nos diga nada, a Gutierrez vai eliminá-lo apenas pela garantia de não ter um possível agente duplo ou um traidor. Ele está praticamente morto, a menos que se torne invisível. Ele não é mais uma ameaça para nós.

Era possível ouvir o arfar do homem, processando a constatação de que em nada do que Dr. Moura disse sobre a Gutierrez e seu futuro havia uma só mentira. Dr. Moura continuou.

- O que você sabe?
- E-eu.... fui designado... para plantar bombas.
- E qual era o alvo?
- A gente ia formar uma força-tarefa com duas frentes. Dhako ia liderar o pessoal para capturar a menina e ia também servir como isca, e eu ia invadir os arquivos e hackear todas as informações para a empresa.
- Quem é Dhako? E por que ele foi destacado como líder?
- Ele já trabalhou aqui. Conhecia vocês, conhecia o lugar, todo o esquema. Ele também é bem letal, sabe? Não pensa duas vezes.
- É o tal Daniel que o Alcebíades falou, é?
- Quieto, Diego. E quantos homens eram ao todo?
- Quatro.
- Quatro? E vocês sabiam quem vocês vinham enfrentar?
- O Dhako sabia. Ele falou do cara dos alces. Ele também falou de um velho, mas disse que ele já devia estar gagá e que não ia ser problema.

Não era preciso ser psicanalista de animais enfurecidos para perceber que o Dr. Moura não só tinha vestido a carapuça como acabara de ter seu orgulho ferido.

- Por que eles querem a menina de volta?
- Eu sei lá? Pelo que eu escutei, ela é a única tentativa de um projeto lá que deu certo. Todas as outras cobaias morreram, sumiram. Dizem que algumas se desfaziam no ar, que nem fumaça, e nunca mais voltavam. Mas eu não sei o que era que eles tavam testando.

Ângela sufocou um soluço de horror e ficou olhando fixamente para o homem. Diego olhava de um para o outro, tentando imaginar o que diabos foi que fizeram com a garota para dar a ela aqueles poderes. Ele lembrou dos koalas na floresta, e decidiu, com muito orgulho de si mesmo, que aquilo era uma constante: laboratórios eram ruins. Pela primeira vez ele estava sentindo uma verdadeira simpatia pela menina.

- Como vocês descobriram a Agência?
- Não foi difícil. A gente tem uns soldados só pra cuidar da menina. Eles enviam relatórios pra base sobre tudo o que ela faz. Se um fio de cabelo dela fica fora de lugar, eles anotam. Eles viram ela sair daqui e quase cair de um prédio. Acharam estranho e anotaram. Na verdade o Dhako achou que tinham envenenado ela... Mas pra mim parece que vocês são amiguinhos...
- E como vocês descobriram que ela veio para cá?
- Ela saiu da casa dela de noite. Ela nunca sai à noite, a não ser pra ir ao cinema. Num namora não, essa aí.

Ângela não conseguia decidir se estava mais estupefata, furiosa ou indignada. Sua única certeza era a vontade de acertar outra panelada*** na cabeça do infeliz.

- Sim, mas como vocês conseguem seguir alguém que se teletransporta?
- Quem disse que a gente consegue? É o chefe dela. O trabalho dela é da Gutierrez, a empresa comprou assim que ela entrou no emprego. A gente dá um salário gordo pro tal do Sérgio e ele fica passando pra gente o endereço de cada pacote que ela vai entregar. É assim que a gente consegue acompanhar o caminho dela e saber pra onde ela tá indo.

Uma das pistolas sem munição que estava à toa por aí voou e acertou a testa do invasor em cheio.

- Seus.... seus...
- Nossa! Ela é boa mesmo! Faz de novo?
- Ok, chega. Qual é o seu nome?
- Florisvaldo. Florisvaldo Júnior****.
- Muito bem, Júnior. – Disse Dr. Moura, ignorando solenemente o primeiro nome do infeliz e rezando para isso nunca chegar nos ouvidos do estagiário da xérox. – Eu vou terminar de entrevistá-lo outra hora. – Dr. Moura debruçou-se sobre o invasor, liberando seus braços e pernas das amarras. – Siga-me. Eu vou levar você para um lugar seguro.

O homem continuou lá, paralisado.

- Mas.... como assim? E o antídoto?
- Que antídoto? Você achou mesmo que eu ia usar paralisante num inútil como você?
- Como assim??? O que você usou nele?
- Soro da verdade, é claro, Diego. Como eu ia ter certeza de que podia confiar nas informações? O Hélio está melhor a cada dia, a fórmula está funcionando que é uma beleza.

E Dr. Moura saiu para o grande salão, dirigindo-se a Romi, trocando com ela uma meia dúzia de palavras, e sendo seguido por Júnior até sair pelas portas recém-liberadas do salão.



* Desde pessoas transparentes, passando por uma enorme árvore que se mexia até uns outros dois que pareciam primos da Romi, além da própria, que ela só reconheceria pela tonalidade metálica ligeiramente diferente.
** Hélio era o químico mais brilhante da Agência. Ele também era um charmoso bon vivant, mas numa festa orgiástica que envolveu óxido nitroso, diversos outros gases e algumas explosões, seu rosto foi desfigurado. Devido ao trauma (e ao óxido nitroso), Hélio se tornou intratável, pois mesmo depois de diversas cirurgias plásticas e terapia, ele continuava com um riso histérico ininterrupto que impede qualquer pessoa de ouvido não treinado sequer de entender o que ele diz. Houve, no entanto, um progresso significativo em suas pesquisas após o acidente.
*** A despeito da insistência do Dr. Moura em dizer o contrário, aquilo com o que Ângela acertou a cabeça do invasor foi, na verdade, algo muito semelhante a uma panela. Se ela era usada para transportar mídia de dados sem infectá-la com contato humano, isso era, para Ângela, outra questão.
**** Sim. É incrível como as pessoas têm a capacidade de, não só cometer um erro, mas também perpetuá-lo.

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